Adolescência + isolamento social = andando na contramão do desenvolvimento?
- Fernanda Travassos-Rodriguez
- 25 de jun. de 2020
- 3 min de leitura

A adolescência é um período do desenvolvimento no ciclo vital do ser humano, notadamente marcado por uma necessidade extrema de impor as próprias ideias, descobrir os seus próprios interesses, diferenciar-se dos próprios pais e constituir uma personalidade baseada na história da família, na própria infância, mas que inclui uma inovação, sendo justamente esse elemento novo, que na “alquimia” com o todo, ajuda o indivíduo a criar uma personalidade única.
Para os pais, com frequência, o fim da infância e a entrada neste período marcam o início de uma fase turbulenta e cheia de conflitos familiares. A adolescência é um período de “crise” propriamente dito. É o momento de descoberta e experimentação, no qual a autonomia e um certo grau de onipotência, se juntam para “empurrar” o indivíduo para uma vivência grupal e social intensa.
Pensar em adolescência por si só já nos remete a ideia de grupos, bandos ou “tribos”. É assim que os adolescentes começam a encontrar pares entre os quais há identificação e a experimentar a vida social de uma forma muito mais plena, livre e autônoma em relação a sociabilidade experimentada na infância
A adolescência é um período de muitas mudanças rápidas e sequenciais, dentre as quais podemos citar a mudança corporal e o início da experimentação da sexualidade. Portanto, uma fase de muitas descobertas, porém de muito trabalho psicológico intenso para dar conta das muitas sensações impostas pelo “boom” de hormônios que afloram, neste período. Esta sobrecarga emocional e social é a única via para se apropriar do novo corpo que emerge e viver uma diferenciação, necessária dos próprios pais para que possa se constituir como uma adulto saudável.
A identificação grupal é o que une e serve de rede ao adolescente que, sem muito entendimento do turbilhão de mudanças dentro de si, encontra pares que passam pelo mesmo e, por um período, passam a ser seu ponto de referência central.
A situação atual imposta pela pandemia do coronavírus, exige isolamento social e isso afasta os adolescentes dos seus grupos e limita a sua liberdade tão sonhada e esperada (mesmo que de forma provisória), afetando as suas conexões com seus grupos que são uma espécie de espelho, neste período desenvolvimental. A quarentena impôs, também de forma abrupta, a ruptura de relações afetivas (crushes, ficantes, namorados...) de início comum nesta faixa etária, e cancelou toda a agenda social que, desde que o mundo é mundo, é o cerne do interesse dos adolescentes.
Um olhar sobre a adolescência durante a pandemia e esse “novo normal” é fundamental, visto que estão, muitas vezes, silenciosos em seus quartos imersos nas tecnologias, redes sociais, games; sem falar da escola que, neste momento, chega também através das telas, bombardeando-os de luzes que prejudicam o seu desenvolvimento, o seu sono e os deixam hiperexitados. Os pais, às vezes, por verem seus filhos quietos e protegidos, não avaliam que algumas das suas necessidades básicas foram subtraídas e isso lhes causa sofrimento, muitas vezes, empurrado-os para ansiedade e depressão (tão comuns nesta faixa etária). Vamos pensar que essa garotada teve alguns sonhos importantes “roubados”, como ausência de rituais de formatura, transição escola – universidade sem socialização, preocupação com o futuro do mercado de trabalho e a crise mundial instalada, dentre outros. Além disso, muitos carregam “secretamente” preocupações intensas com a saúde dos pais e avós que por muitas questões, podem precisar sair de casa. Outros, ainda, perderam entes queridos, fazendo-os lidar com o luto complicado destes últimos tempos.
São muitas as questões que envolvem o período da adolescência numa pandemia, mas aqui gostaria de deixar salientado que: se o seu filho anda muito quietinho no quarto, busque interagir; e jamais subestime o sofrimento do adolescente, neste período. Sua problemática pode parecer simples aos olhos de um adulto, mas são de fundamental importância para estes indivíduos a pleno vapor na transição que os levará para a vida adulta.
Fernanda Travassos-Rodriguez
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